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O Trabalho Profissional no Judiciário como fonte de Stress Ocupacional

Autor: 
Mônica de Lurdes Leoni Carteiro
Autor: 
Psicóloga Judiciária - Fórum de Santo Amaro

Os assistentes sociais e psicólogos judiciários deparam-se, na sua prática cotidiana, com situações críticas que envolvem crianças, adolescentes e familiares. São pessoas que, via de regra, esgotaram as demais possibilidades de ajuda e buscam a intervenção judicial como último recurso, na expectativa de que o seu problema seja, enfim, resolvido pelo juiz, figura mítica associada ao poder e à sabedoria.


Mas são os técnicos, num primeiro momento, que entram em contato direto com as mazelas dessa população desgastada, sem esperança e, infelizmente, cada vez mais próxima do colapso social e psicológico.


É sobre eles que é descarregado o conflito entre assumir o filho ou entregá-lo em adoção, a frustração pela falta de condições econômicas para manter uma família, o cansaço pela busca inútil por vaga na escola ou no centro de saúde, a impotência diante do filho drogado e delinqüente, a dor e o rancor da separação, a discórdia em torno da disputa do filho, a ira da mãe inconformada com a decisão judicial, a ameaça diante de um parecer desfavorável, o choro da criança que pressente a institucionalização, o impacto da denúncia de violência doméstica, a dúvida sobre a ocorrência do abuso sexual e muitas outras questões sociais, institucionais, pessoais e familiares.


Além de terem de lidar com essas demandas, os profissionais não contam com uma retaguarda que lhes permita contribuir minimamente para alterar a dura realidade em que vivem as pessoas atendidas; defrontam-se diariamente com a carência de vagas em abrigos adequados, a falta de profissionais de saúde mental para o atendimento das crianças, adolescentes e famílias, a ausência de locais especializados para crianças e jovens especiais, a escassez de assistência jurídica... enfim, encaram o sucateamento da rede social, sem vislumbrarem a sua recuperação, ao menos a curto e médio prazos.


Soma-se à insuficiência de recursos a desarmonia e a rigidez na organização laborativa: demanda crescente, pressões para o acúmulo de funções, inclusive as que não estão previstas nas respectivas especificidades, abuso ou omissão de poder, relações tensas e desgastadas entre as equipes. As condições de trabalho são precárias: acomodação em locais "adaptados", emprestados ou cedidos, agitação e barulho excessivos, equipamentos insuficientes ou em mau estado, falta de material básico como água, copos, papel higiênico e sabonete.


Nesse contexto, é muito comum os técnicos levarem serviço para casa, valerem-se de seus próprios veículos para fazerem visitas e utilizarem seus próprios computadores e telefones para agilizar as tarefas que não são viáveis nos Fóruns por falta de recursos. Ou seja, sua vida pessoal e familiar também é afetada pela crise no trabalho.


Segundo Dejours (1991) "Toda a família é requisitada pelo trabalhador em seu esforço de enfrentar as dificuldades no trabalho. O cônjuge, os filhos e às vezes até os pais são atingidos indiretamente, mas também fortemente, pelos efeitos da situação do trabalho sobre aquele que nela se encontra exposto."


Sobre esse dia-a-dia de tensões, sobressaltos, improvisações, esforços vãos, espaços inadequados, de frustrações diante da impossibilidade de uma resposta ao desespero das partes e também dos profissionais, cabe a reflexão: "A gente se acostuma" ou "a gente vai levando...", mas, a que preço e até quando?


Nos Setores Técnicos, são cada vez mais freqüentes as queixas de taquicardia, dores no peito, pressões e zumbidos nos ouvidos, cefaléias, dores de estômago, crises hepáticas, cansaço generalizado, além de tensão pré-menstrual e problemas ginecológicos. Na área emocional, evidenciam-se desde a apatia, a depressão, o desânimo, até a hipersensibilidade emotiva, a raiva, a ansiedade e a irritabilidade.


Segundo Rosch (1996), "A maior fonte de stress para os adultos é o stress profissional, há pouco tempo descrito pela Organização Mundial de Saúde como uma "epidemia global". Segundo o autor, "o stress ocupacional é muito freqüente quando há a percepção de ter muitas responsabilidades significativas mas poucas possibilidades de tomadas de decisão e de controle".


De acordo com Lipp (1996), "Além de desencadear sintomas psicológicos, o stress pode contribuir para a etiologia de várias doenças mais graves e afetar profundamente a qualidade de vida individual e de populações específicas. Dentre as doenças psicofisiológicas estudadas que têm o stress presente em sua ontogênese, como um fator contribuinte ou desencadeador, encontram-se: hipertensão arterial essencial, úlceras gastroduodenais, câncer, psoríase, vitiligo, retração de gengivas, depressão, pânico e surtos psicóticos."


Frenderberger e Richelson (apud Covolan 1996) caracterizam o termo burnout (algo que deixou de uncionar por exaustão de energia) como sendo o estado de fadiga ou frustração causado pela dedicação excessiva e prolongada a uma causa; ocorre também quando a pessoa persiste na busca de uma meta ou no preenchimento de uma expectativa realisticamente impossível naquele momento.


Segundo os autores, o burnout instala-se lentamente , não importando quão repentinamente possa surgir, e se constitui numa condição crônica, que se desenvolve por um período de semanas, meses e até anos. Freqüentemente não é notado nos seus estados iniciais e pode atingir tanto homens quanto mulheres, de diferentes faixas etárias e diversas profissões, embora as que requerem um alto grau de contatos interpessoais como professores, assistentes sociais, psicólogos, médicos e advogados sejam mais afetadas.


De acordo com França (apud Covolan, 1996), há uma incidência predominante do burnout em profissionais que atuam em ciências humanas pois, além do contato direto com o sofrimento do próximo, existe um alto contingente de elementos imponderáveis, próprios do tipo de trabalho, como uma certa identificação e os laços afetivos que, muitas vezes, se estabelecem entre o profissional e o cliente.


Além disso, o ambiente é de alto potencial estressante. Os trabalhos que desenvolvem exigem grau de qualificação intelectual e decisões importantes, têm peso emocional excessivo e são exercidos durante anos, com carga horária excessiva.


Maslach (apud Covolan 1996), salienta que as causas do burnout não estão localizadas em traços permanentes das pessoas, mas em certos fatores situacionais e sociais específicos que podem ser influenciados e modificados.


Considerando esses dados e as condições de trabalho a que têm se submetido, é urgente que os assistentes sociais e psicólogos judiciários tenham clareza dos limites mas também das possibilidades de seu papel profissional e resgatem a sua capacidade de modificação desse árduo cotidiano.


A mudança da condição de pacientes que sofrem para a de agentes que se somam para transformar, passa pela reflexão constante sobre a prática, mas também pela união entre as equipes e por uma maior participação em entidades representativas de classes, como a AASP, a fim de que a categoria seja fortalecida.


É, sem dúvida, uma jornada longa e difícil, que se faz a pequenos passos e que exige persistência e tolerância a frustração. Por isso mesmo, é preciso inicia-la já, com a contribuição de todos.


Fontes consultadas:


Dejours, Cristophe A loucura do trabalho 5a. ed.ampliada - São Paulo: Cortez-Oboré, 1992.


Lipp, Marilda Emanuel Novaes (org.) Pesquisas sobre stress no Brasil Campinas, SP : Papirus, 1996



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