Assédio moral no trabalho – Um problema a ser enfrentado coletivamente
A violência no contexto laboral é um fenômeno que prolifera e se fertiliza no meio social em que vivemos, marcado pela competitividade, pela ideologia da excelência (busca de um padrão de perfeição inalcançável a serviço dos interesses do capital), pela flexibilidade para se adaptar a mudanças cada vez mais rápidas e pela “descartabilidade” dos trabalhadores. Uma das formas de expressão dessa violência é o assédio moral, que consiste no ataque à dignidade de alguém por meio de uma prática desmoralizante, que pode ser explícita ou velada, e que objetiva isolar cada vez mais a pessoa visada, excluindo-a, desqualificando-a profissionalmente e desestabilizando-a emocionalmente (Seligmann-Silva). Comumente, o assédio moral se dá de maneira vertical – do chefe contra o subordinado – mas também pode se manifestar de subordinado contra chefe. Já a forma horizontal de assédio consiste em ataques direcionados a um colega do mesmo nível hierárquico.
Embora renomados estudiosos só reconheçam a existência de assédio moral quando a prática ofensiva é repetitiva, sistemática e deliberada, durante um período prolongado de vários meses, especialistas como Margarida Barreto e José Roberto Heloani têm contestado a necessidade de que haja um período temporal para se caracterizar o assédio, considerando que um único ato desmoralizador pode causar um dano irreparável ao trabalhador.
Interpretar o assédio como uma ação individual – de assediador contra assediado – reduz a compreensão do fenômeno e leva a rotular algozes e vítimas sem que se chegue ao cerne da questão, que é o contexto organizacional. A estratégia assumida pelas organizações frequentemente favorece, permite e até encoraja o assédio à medida que impõe metas, muitas vezes inatingíveis, exige uma produtividade inalcançável, fomenta a competitividade, avalia desempenho, intimida com punições ou ameaças de demissões.
Nesse sentido, não basta identificar o assediador, denunciá-lo e culpabilizá-lo, uma vez que ele, na maioria das vezes, é apenas a ponta do iceberg. A individualização desse problema contribui para escamotear e perpetuar práticas abusivas da organização. Ademais, a vitimização dos trabalhadores que são assediados dificulta que eles percebam seus potenciais para revalorizar a autoimagem e recuperar a confiança em si mesmos.
Para superar esse sofrimento, é essencial que se busque uma visão objetiva do contexto laboral e dos conflitos de poder nele travados. Outrossim, ao compreender o assédio como uma problemática coletiva, os trabalhadores não se verão mais sozinhos e se juntarão a uma luta que os leve a transformar essa situação em benefício de todos.
Portanto, para que se tenha êxito no enfrentamento do assédio moral, se fazem necessárias estratégias que recuperem a força do coletivo e deem voz àqueles que sentem seus efeitos na própria pele. É com esse objetivo que a AASPTJ-SP, a AFFOCOS, ASSOJUBS E ASSOJURIS estão realizando a pesquisa Saúde e Trabalho no TJSP – um estudo qualitativo das condições de vida e trabalho e suas repercussões na saúde física e mental de funcionários, sob coordenação da socióloga Agda Delia e consultoria da Dra. Edith Seligmann-Silva, pesquisadoras com ampla experiência em estudos sobre a relação Trabalho e Processo Saúde-Doença.
Para mais informações sobre a problemática do assédio moral, recomendamos as seguintes obras:
Trabalho e desgaste mental: o direito de ser dono de si mesmo/ Dra. Edith Selligmann-Silva. São Paulo: Cortez Editora, 2011.
Assédio moral no trabalho/Margarida Barreto, Roberto Heloani e Maria Ester de Freitas. São Paulo: Ed. Cengage, 2008
Violência, saúde e trabalho: uma jornada de humilhações/Margarida Barreto. São Paulo: EDUC; FAPESP, 2003.