CFESS e CFP manifestam apoio ao III PNHD
CFESS
O CFESS, considerando seu compromisso com a construção de uma agenda política emancipatória, vem a publico, manifestar apoio, ao III Programa Nacional de Direitos Humanos.
Persiste na sociedade brasileira a violação cotidiana dos direitos humanos. Violação que se materializa nas ruas das grandes e pequenas cidades e no campo e vem sendo traduzida através da criminalização dos pobres e da pobreza, da criminalização dos movimentos sociais e da violência indiscriminada que sofre a população brasileira. Homens e mulheres são usurpados de seus direitos mais elementares, condenados sumariamente e submetidos a diferentes formas de dominação, exploração e opressão que são reveladoras da barbárie da sociabilidade capitalista.
O III Programa Nacional de Direitos Humanos apresenta questões fundamentais que historicamente têm mobilizado diferentes sujeitos coletivos que atuam na luta política em defesa dos direitos humanos e neste sentido traz para o cenário contemporâneo do debate questões como:
· a garantia dos direitos das mulheres para o estabelecimento das condições necessárias para sua plena cidadania. Disposto na diretriz 9 do combate as desigualdades, aponta como ação programática apoiar a aprovação do projeto lei que descriminaliza o aborto, considerando a autonomia das mulheres sobre seu corpo e recomenda ao poder legislativo a adequação do código penal para a descriminalização do aborto.
· A necessidade da revisão da lei da anistia com ênfase na preservação da memória histórica e a construção pública da verdade sobre os fatos passados no período da ditadura militar (1964 -1985). Entendemos ser impossível falar em construção democrática de um País sem conhecimento e preservação da memória histórica, notadamente de acontecimentos que por terem rompido com valores democráticos e humanos não podem e não devem ser reproduzidos pelas novas gerações.
· A democratização da propriedade e a criação de uma espécie de câmara de conciliação para conflitos agrários antes que sejam conseguidas na Justiça liminares de reintegração de posse.
· Respeito à diversidade religiosa e de crença, liberdade de culto e garantia da laicidade do Estado
· A valorização da diversidade humana com o reconhecimento da livre orientação sexual, pautando união civil entre pessoas do mesmo sexo.
Todas essas questões são absolutamente relevantes e exatamente por isso consideramos que há muito por avançar na luta pela efetivação dos direitos humanos no Brasil, para que as diretrizes propostas se materializem em políticas de Estado e se tornem concretas no cotidiano de homens e mulheres.
Entendemos que o posicionamento do governo em recuar de questões pautadas e debatidas histórica e incansavelmente em espaços democráticos, previstos inclusive no PNDH, como conselhos e conferências, nos coloca em sinal de alerta, pois contrariando lutas históricas dos movimentos sociais e diferentes instituições e sujeitos coletivos, vê-se forças conservadoras pautando as ações do Estado. Isto representa um retrocesso para a democracia e para o sistema de construção participativa, colocando em risco a viabilidade do programa, para atender interesses econômicos, políticos e culturais das forças conservadoras atuantes no âmbito das igrejas, da corporação militar e do agronegócio.
Neste sentido repudiamos qualquer tentativa ou proposta de alteração no PNDH, o que significaria recuar na elaboração de políticas de Estado absolutamente necessárias para assegurar os direitos humanos no Brasil.
Estamos em alerta e na luta cotidiana com atitude critica para cada vez mais tornar visível as ações políticas e as reivindicações dos sujeitos políticos na luta por respostas concretas do Estado para assegurar os direitos humanos. Como já afirmamos no CFESS Manifesta “Direitos Humanos: para refletir e lutar todos os dias!” datado de 15/12/2008, o tempo presente é também tempo de tecer a resistência e fazer valer as iniciativas coletivas de luta.
CFP
Sobre as tentativas de minimização da abrangência do III Plano Nacional de Direitos Humanos
O III Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH) foi, dos três PNDHs, o que notadamente se construiu de forma transparente, envolvendo consultas públicas, grande participação popular, conferências municipais e estaduais com a participação de cerca de 14.000 pessoas, representando o poder público e a sociedade civil.
Procurando a efetivação de uma verdadeira política de Direitos Humanos, imprescindível para a construção de um país democrático e para todos, tornava-se indispensável enfocar questões como a democratização da propriedade, dos meios de comunicação, da abertura dos arquivos da ditadura militar (1964-1985), questões de gênero e direitos da mulher, como o direito sobre seu corpo.
Pioneiro na discussão da relação entre modelo de desenvolvimento e Direitos Humanos, afirmando a impossibilidade de efetivar os Direitos Humanos no Brasil sem o combate às desigualdades de renda, raça/etnia e gênero, e à violência nos centros urbanos e no campo, o PNDH III caminha na direção de concretizar o que já foi ratificado nos inúmeros Tratados Internacionais assinados pelo Brasil, no âmbito das Nações Unidas e do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
A proposta atual, que vem sendo bombardeada por setores da mídia, da igreja católica e evangélica, militares e ruralistas, dentre outras oligarquias – que sempre reagem violentamente a qualquer tentativa de mudança no quadro dos Direitos Humanos no país – coloca seis eixos orientadores, que não podem ser negligenciados, sob pena do fortalecimento de uma visão anacrônica dos direitos humanos, confundindo-os com direitos individuais e de propriedade de alguns, e produzindo cada vez mais uma enorme massa de excluídos de direitos – excluídos de humanos direitos.
A experiência da violência da ditadura militar e da violência de seus agentes, autorizados a torturar e a fazer desaparecer corpos, vestígios e memória histórica, ainda está presente e marcando a nossa sociedade. Outrora contra os subversivos, hoje o aparato policial militarizado volta-se contra a população pobre, em suas comunidades, nas prisões, nos cárceres e a céu aberto.
Como psicólogos devemos sublinhar que a reação a qualquer tirania é e sempre será um movimento ativo e saudável. Como cidadãos conscientes e não subjugados a um pensamento hegemônico e empobrecedor das singularidades, devemos apontar que há uma enorme e premeditada produção de confusão sobre a abrangência do III PNDH.
Há uma enorme diferença entre a necessária abrangência de um efetivo e inclusor Plano Nacional de Direitos Humanos e “um plano saco de gatos”, como querem fazer acreditar alguns.
Há uma enorme diferença entre anistia e impunidade, assim como há uma enorme diferença entre luta democrática, mesmo a chamada luta armada, contra uma ditadura feroz, detentora de poder absoluto, de recursos bélicos e formas de repressão violenta a esses grupos, assim como de métodos de produção de subjetividade sobre a sociedade: produção de silenciamento por intimidação.
Há uma escolha a fazer, por um presidente e por um povo, para que a História não se repita como farsa.
Assinamos esta Nota Pública, bem como assinamos todas as notas de repúdio às tentativas de minimização da abrangência do III PNDH.
Brasília, 14 de janeiro de 2010
Humberto Verona - Presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP)
Ana Luiza de Souza Castro - Coordenadora da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia (CNDH/CFP)