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DSD: AASPTJ-SP em mais duas ações

Autor: 
Ana Carolina Rios
Semana passada a AASPTJ-SP empreendeu mais duas ações sobre a metodologia conhecida em todo o país como Depoimento Sem Dano. A convite da equipe técnica de Taubaté, representantes da Associação estiveram lá no último dia 12 para uma conversa entre técnicos, juízes, promotores e defensores públicos da região. No dia 13 acompanhamos outra ação promovida por assistentes sociais e psicólogos judiciários. Estivemos na Defensoria Pública de Santo André, que organizou uma audiência pública sobre o tema. A presidente da AASPTJ-SP, Elisabete Borgianni, foi uma das palestrantes.

A reunião em Taubaté foi muito proveitosa e se constituiu num ótimo espaço de reflexão e debate entre os diversos atores do Sistema de Justiça. Elisabete, o primeiro tesoureiro, Eduardo Neves, as conselheiras fiscais Claudia Anaf e Maíla Vilela e o assessor jurídico Thiago Pugina representaram a AASPTJ-SP.

Elisabete iniciou a reunião falando sobre o histórico do uso da metodologia no Brasil, passando pela experiência inicial no Rio Grande do Sul, pela preocupação dos conselhos profissionais em estudar se o método não feria as atribuições profissionais, as resoluções do CFESS e CFP, das resoluções com efeitos suspensos em diversos estados, os diversos projetos com diferentes nomes que pipocaram em diversas regiões e especificamente o protocolo adotado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.

Em seguida, a presidente passou a falar de como este tipo de metodologia pode ser danoso para a criança e o adolescente e sobre a dificuldade de se trabalhar com a memória traumatizada da criança. “A parte do cérebro referente à memória não está totalmente formada na criança e ela não consegue responder o que a Justiça quer. Perguntas como: ele era alto? Qual era a cor da roupa dele? São incompreensíveis para a criança, que pode reproduzir falsas memórias”, disse. Para ela, a metodologia também dificulta o trabalho do técnico. “O psicólogo, por exemplo, não trabalha com o que a criança fala, mas com os anticorpos que ela cria diante do abuso”, alegou.

Neste sentido, Claudia, que é psicóloga lembrou-se dos estudos de Alfred Binet, educador e psicólogo francês que analisou o comportamento de crianças. “Binet colocava um desenho de um quadro com um botão no centro na parede e perguntava às crianças o que elas viam e elas respondiam ‘um botão’”, explicou. “No entanto, quando ele fazia perguntas sugestivas como ‘o botão tem fio?’ as crianças mostravam-se confusas e respondiam que sim apenas porque a pergunta sugeria isso. Portanto, não podemos fazer este tipo de questionamentos para as crianças”, expôs.

Claudia também apontou exemplos ocorridos na França. “A histeria em se punir abusadores lá acabou causando um prejuízo enorme ao erário daquele país. Anos mais tarde descobriu-se uma série de erros jurídicos em diversos casos e o governo teve que arcar com indenizações milionárias”, contou.

Os promotores presentes disseram que para o Ministério Público a preocupação maior é com a coleta da prova. Os defensores públicos manifestaram preocupação com a preservação do contraditório.

“A questão que se está discutindo não é somente a qualidade da prova, mas também o dano que a prova causa na criança”, apontou Thiago. Para ele, a melhor opção ainda é deixar o técnico trabalhar sozinho com a criança para um estudo completo do caso dela. Juízes, promotores e defensores repassam perguntas ao assistente social ou psicólogo na forma de quesitos e o técnico avalia a viabilidade de respondê-las.

“Criou-se no ramo do Direito uma teoria jurídica que está em voga há décadas de que a palavra da vitima nos crimes sexuais é de suma importância e deve ser levada em consideração. Será que não seria o caso de repensarmos isso?”, sugeriu o juiz criminal Flavio de Oliveira Cesar.

Avaliamos o encontro como muito profícuo. Propiciou um amplo debate, com os diferentes ângulos da Justiça e que trouxe muita reflexão para todos.

Santo André
A audiência pública em Santo André também foi uma ótima oportunidade de ampliar o debate sobre o tema. Compareceram cerca de 70 pessoas. O evento foi uma iniciativa da equipe técnica do fórum em parceria com a Defensoria Pública.

Elisabete Borgianni, presidente da AASPTJ-SP foi a primeira a expor. Em sua fala, demonstrou a preocupação com o crescente populismo punitivo na sociedade e que tem permeado e fragmentado o trabalho da defesa dos Direitos Humanos. “Atualmente, as grandes ONGs precisam promover fortemente alguns temas para conseguir captar recursos e se manterem. Na minha opinião, esta metodologia do Depoimento Sem Danos se encaixa neste contexto. Há muito interesse por traz disto”, opinou. Citou o exemplo do Rio Grande do Sul cujas estatísticas mostraram que o índice de responsabilização nos casos de abuso de crianças e adolescentes subiu de 3 para 52%.

A representante da Associação falou mais uma vez sobre a precariedade da prova produzida a partir da inquirição de crianças com memória traumatizada. “Já temos vários estudos que demonstram que não podemos trabalhar com a  memoria traumatizada da criança e apesar disso o CNJ fez uma recomendação dessas e o Tribunal de São Paulo implanta um protocolo desses, e implantou sem ter tido o menor controle do que ocorreu no projeto piloto”, desabafou.

Em seguida, ouvimos a fala do advogado e consultor na área da Infância e Juventude, que também já atuou como juiz e promotor de justiça, João Batista da Costa Saraiva. Ele lembrou que o Depoimento Sem Dano no Brasil surgiu como um estudo acadêmico que apresentava a metodologia como uma hipótese alternativa. “Fiz parte da banca de defesa desta tese e na época achei interessante. O que me incomoda é que de repente, de hipótese ela está virando política pública”, disse.

Para ele, o DSD está inserido em um contexto marcante do século XXI que é a bandeira do combate à pedofilia. “Basta ver a reação das pessoas. Você questiona a metodologia e elas te perguntam: ‘mas você é contra? Então você é a favor da pedofilia?”, desabafou. “Sim, nós todos devemos combater a impunidade, mas condenando o que é passível de ser condenado. Quando os indicadores de eficiência de um sistema são os índices de condenação não, ele não é confiável”.

Por fim, disse que é preciso discutir o tempo da criança.  “A dimensão do tempo para uma criança é totalmente diferente da de um adulto. O Judiciário precisa aprender a lidar com isso. Não faz sentido eu ouvir uma criança de três anos. Um adolescente de 13 eu posso ouvir, mas em todo caso, só vou ouvir se o técnico me disser pode ser ouvido. Fora isso quem vai ouvir é o técnico, me basta o laudo”, alegou.

Ligia Vezzaro Caravieri, psicóloga do Crami (Centro Regional de Atenção aos Maus Tratos na Infância) do ABC falou de seus vinte e um anos de experiência com escuta de crianças e adolescentes que sofrem violência sexual e também com o tratamento dos autores da violência. O Crami recebe em média anual 200 famílias em que houve caso de abuso sexual de criança. Na sua opinião, a criança que sofre violência sexual é tratada como objeto pelo abusador, mas também é objeto no sistema Judiciário. “Falamos tanto na prioridade da criança, mas no Depoimento Sem Dano a prioridade não é ela e sim a responsibilização do autor do abuso”.

Por fim, o representante do CRP-SP Gustavo de Lima Bernardes Sales falou sobre a contradição brasileira. “Em termos de legislação e políticas públicas somos vanguarda da garantia de direitos, haja vista o ECA, a Lei Maria da Penha, o Estatuto do Idoso. Mas, culturalmente parece que estamos alguns milênios atrasados”, pontuou. Para ilustrar esta tese, ele contou uma de suas experiências de atendimento de autor de violência em Campinas. Ele atendeu um rapaz que espancou um travesti. “Em um determinado momento ele me disse: ‘isso é uma vergonha. Até eu no carnaval me visto de mulher, a gente de brinca. Mas, você viver deste jeito…’ Ele trouxe uma lógica que não é dele. Socialmente nós endossamos que transgredimos um paradigma mas não rompemos com ele.”

Ao final da audiência foi aprovado o encaminhamento de organização de um Grupo de Trabalho para debate do Depoimento Sem Dano e ações de resistência como, por exemplo, organizar uma audiência pública na Assembleia Legislativa. A primeira reunião do GT ocorre no próximo dia 22. O GT será composto por representantes da Defensoria, Cress (que estava presente no evento, embora sem fala na mesa), CRP, equipe técnica do fórum de Santo André, AASPTJ-SP, Crami e outros parceiros da rede.

A Defensoria disponibilizou os vídeos da audiência pública no youtube:


 


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