Entre “mártires” e “reis”: TJ-SP e PM agem com agressão durante assembleia dos servidores


A cena é de 2010, mas bem poderia ser de 1968, quando o Regime Militar mostrava o seu poder por meio do uso da força bruta. Spray de pimenta, balas de borracha e bombas de efeito moral. Foi isso o que os servidores do Judiciário paulista receberam no fim da assembleia geral realizada na tarde de ontem. De forma repressora e covarde, a Polícia Militar partiu para cima dos trabalhadores, que de forma pacífica organizaram um manifesto que consistia em “abraçar” o Fórum João Mendes por cerca de meia hora. (Veja vídeo gravado pela reportagem da AASPTJ-SP).



 Ainda ontem, o Tribunal de Justiça, divulgou em seu site sua versão dos fatos. Alegou que o tumulto foi iniciado “com uma pedrada desferida contra a cabeça de um oficial da polícia militar” (veja comunicado do Tribunal). No entanto, nem a PM nem o TJ identificaram o policial agredido.


Por outro lado, diversos servidores foram feridos durante a atuação da PM, fortemente armada, como se pode notar nas diversas fotos e vídeos registrados pelos grevistas e pela imprensa que cobria a manifestação pacifica do movimento. Os trabalhadores registraram boletim de ocorrência no 1º DP de São Paulo. Um homem inconsciente teve de ser socorrido pelo resgate. No site G1 foto, é possível ver a imagem que registrou o momento em que a polícia agride o manifestante (veja aqui). Elisabete Borgianni, presidente da AASPTJ-SP acompanhou o resgate e o atendimento realizado no hospital a este possível servidor do Tribunal. A presidente da Associação dos Oficiais de Justiça (Aojesp), Yvone Moreira, foi hospitalizada com ferimento no seio. Um dos cinegrafistas do programa Serviço Publico & Cidadania, mantido pela Federação da Entidades dos Servidores Públicos do Estado de São Paulo (Fespesp) também foi atingido no peito por uma bala de borracha.




O comunicado do Tribunal apresenta uma imagem minúscula de pedras recolhidas na Praça João Mendes. Vale ressaltar que nenhum fotógrafo do TJ acompanhou os acontecimentos diante do fórum. A instituição não apresentou imagens de servidores atirando pedras. O texto divulgado foi escrito pela assessoria de imprensa dentro de seu gabinete, apresentando informações vagas, sem citar as fontes e identificar os nomes das pessoas agredidas pelas pedras, que por sinal não mostram mancha de sangue, o que seria normal, já que o policial foi atingido na cabeça. Mais uma vez, o TJ divulga mentiras na tentativa de desmoralizar o movimento pacífico dos servidores e passar à sociedade que a intransigência nas negociações ocorre por parte dos grevistas. Falsamente divulgam à mídia que apresentaram a proposta de reposição de 4,77%. Não explicam que apenas prometeram enviar Projeto de Lei à Assembléia, sem sequer ter negociado com o Executivo a aprovação e cumprimento do PL. Os próprios negociadores do TJ alegam que o governo “empurraria a discussão do Projeto com a barriga até dezembro.”


As cenas da selvageria provocada pela tropa da PM nos lembram a entrevista concedida pelo presidente do TJ, desembargador Antonio Carlos Viana Santos, ao jornal Folha de S. Paulo no dia 18 de junho. “Eles estão loucos para ter heróis e mártires. Estão provocando”, afirmou ao repórter “prevendo” que poderia haver confronto entre a PM e os servidores em greve. As cenas de ontem deixaram claro que a “previsão” do chefe maior da alta cúpula do maior Judiciário do País, foi muito mais uma promessa de que agiria com truculência caso os servidores persistissem no movimento de paralisação. Os “mártires” foram criados pelos “reis” e não pelo movimento.


Não por acaso, a palavra “mártires” novamente foi usada diversas vezes pelo representante do TJ durante a reunião de negociação realizada ontem por volta do meio dia, antes do inicio da assembléia geral. O desembargador William de Campos expôs a posição do Tribunal diante do movimento. “Nós queremos que os servidores voltem a trabalhar, vocês (representantes das entidades) querem martirizar”.


O que o Poder Judiciário de São Paulo não conseguiu explicar até o momento, seja para a Comissão de Negociação das entidades, seja para a imprensa ou sociedade, é o fato de não haver verba suficiente no orçamento para a reposição salarial dos servidores, mas ter dinheiro para o pagamento em dia de indenizações de juízes e desembargadores, além de outros provimentos ainda não explicados, como o auxílio-voto. Vale lembrar que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por duas vezes cobrou o TJ-SP explicações sobre o pagamento deste auxílio, que estaria sendo realizado de forma ilegal. Por diversas vezes, a Comissão de Negociação solicitou a presença de representantes da Comissão de Orçamento do TJ para que demonstrassem com números que não é possível garantir as duas datas-base vencidas (2009 e 2010) e o percentual acumulado desde 2004. No entanto, os desembargadores da referida Comissão negam-se a comparecer às reuniões de negociação.


Ontem, os representantes das entidades insistiram no fato de que falta vontade política por parte do Tribunal em resolver a situação dos seus funcionários. Lembraram ao desembargador William e ao desembargador Samuel Alves de Melo Junior, que também participou da reunião, que nos anos anteriores o TJ sempre garantiu a reposição dos servidores usando o duodécimo e buscando suplementação de verbas junto ao governo estadual. O desembargador Samuel confirmou que esta seria uma possibilidade, mas que o Tribunal, ao que tudo indica, não está disposto a ter esta atitude política. “Estamos em um impasse sem solução. A alta administração do TJ não aceita negociar nada enquanto os servidores estiverem em greve e vocês (servidores) não aceitam parar o movimento enquanto não houver proposta concreta do Tribunal”.


“Quando um servidor passa no concurso público ele entra no Tribunal com uma expectativa de salário e organiza toda a sua vida em torno deste vencimento. Ao ficar anos sem reposição, seu orçamento é todo desorganizado e o servidor não vê outra alternativa do que ir à luta. Os assistentes sociais e psicólogos, por exemplo, estão perdendo 700 reais por mês”, pontuou Elisabete Borgianni, presidente da AASPTJ-SP. “Quando os senhores nos pedem para parar com a greve, estão solicitando que o servidor pare de lutar por sua subsistência e volte a trabalhar sem receber nada”, completou.


Outro ponto sem explicação é a demora no andamento do dissídio coletivo instaurado pelo Sindicato União e pelas entidades, quando o próprio Regimento Interno do TJ estabelece que, em situação de greve, os prazos do processo devem cair pela metade.


Em resposta, os servidores presentes na Assembleia votaram pela continuidade da greve. Também aprovou-se a realização de um ato em Brasília, a ser organizado pelas entidades e nova assembleia geral na próxima quarta-feira (14/07).


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