Homenagem à Maria Francisca Cardoso Sampaio
Veja homenagem preparada pela psicóloga de São João da Boa Vista Ligia Ferreira Galvão à colega Maria Francisca Cardoso Sampaio, falecida em março:
"Do seu sorriso.
De nossas conversas sobre política; de que sentávamos lado a lado pra trabalhar; de que trocávamos impressões sobre nossos atendimentos e relatórios; das vezes em que te dei carona até sua cidade; da sua letra; dos termos e expressões que aprendi a usar com você; da sua presença calma, silenciosa e tão forte.
Do seu olhar. Do seu estojo marrom, do seu bom gosto pra se vestir, da sua elegância; da sua vaidade sem peruíce; do seu amor pelo povo; da sua sensibilidade; da sua determinação e bravura pra lutar contra qualquer injustiça; da sua presença amorosa, solidária e cuidadosa, naquelas vezes em que desabei na sua frente. Da sua confiança em compartilhar comigo algumas de suas preocupações; da sua voz.
Das suas expressões faciais, inequívocas. De quando eu chegava mais cedo e ia junto almoçar com você e nossas colegas; de quando você usou aquela peruca que achei linda; de quando você decidiu abolir a peruca; de quando você voltou das férias em Minas, radiante e renovada; de quando participamos juntas do Seminário, logo que te conheci; do como você estava contente com seu cabelo voltando a crescer.
Do seu jeito de parar, esperando a gente adivinhar alguma coisa. De como eu gostei de você, desde o primeiro dia; do quanto você me tratou bem e com tanta atenção que parecia que eu era a pessoa mais especial do universo; de quanta afinidade descobri ter contigo; do como você às vezes parava pra pensar e pesar as palavras que iria dizer; do cuidado como você as dizia; das coisas engraçadas e do seu fino humor.
Da sua amorosidade. Dos abraços trocados quando férias ou momentos de ausência prolongados, porque no dia a dia o bom dia estava de muito bom tamanho; das discussões que você conseguia que não descambassem pro embate infrutífero; do seu guarda-chuva. De você rindo e me ensinando a enrolar os fios emaranhados dos gadgets que eu inventava trazer todos na bolsa.
Da sua exuberância contida. De nós cantando Clara Nunes, você me corrigindo pedaços inteiros da letra; sua voz afinada e bonita; seu sorriso comovido em situações em que compartilhávamos ternura, amizade, afeto, amor, companheirismo. De tantas coisas, tantos momentos, tantas cenas…
Lembro de tudo e sempre vou lembrar, Fran.
Franzinha. Francisca.
Nossa mineira guerreira, grande companheira. Sua partida ainda é muito recente pra que a gente consiga guardar no peito tantas lembranças, tanta saudade, sem extravasar um rio de lágrimas. Mas tenho a certeza de que, assim como na minha, a sua chegada na vida de cada pessoa que te conheceu foi um acontecimento, um evento. Solene, grandioso, rico de sentidos e de humanidade. E cheio de humana intimidade. Pois foi assim que você viveu sua vida e quem te conheceu sabe muito bem disso. Disciplinadamente coerente com seus princípios, suas crenças; com o que valorizava. Solidária. Atenta, antenada. Solícita. Forte. Personalidade marcante. Presente. Necessária. A rigor: indispensável.
Talvez eu devesse ter-me feito mais próxima e presente na sua vida, nos últimos tempos, como eu bem desejei. Mas me acomodei na impotência, na desculpa da distância geográfica, na transferência da responsabilidade pessoal e intransferível de cuidar de quem se ama, de cuidar do amor por quem se ama, na eterna justificativa de estar afogada em tarefas que nunca acabam. Só que agora, como você talvez dissesse, não é mais hora de chorar pelo que não foi feito, pelo que não deu, pelo que precisava ter sido dito ou feito. Agora é hora de, imitando você, continuar a celebrar a vida. Sendo cada um a seu modo, como você gostava de garantir.
Agora, e aqui, ao meu modo, e com imenso amor, celebro sua vida. Seus dias, sua passagem por essa existência, querida e amada amiga. Sua passagem por minha vida. Passagem relativamente breve. Mas profundamente transformadora. E isso não me vai sair da memória, mesmo se esta pretender um dia me trair. Lembro de tudo, Fran. E sei que sempre vou lembrar. Porque acredito que o amor… o amor é aquilo de que alguém jamais se esquece."