Para que lado vamos agora?

Autor: 
Ana Carolina Rios

E a tarifa caiu em São Paulo! No início da noite de quarta-feira (19/06), o governador do Estado, Geraldo Alckmin (PSDB), e o prefeito, Fernando Haddad (PT), anunciaram em uma coletiva de imprensa a volta das tarifas de trem, ônibus e metrô para R$ 3,00 a partir da próxima segunda-feira. Quando o Movimento Passe Livre iniciou os protestos ambos foram taxativos em afirmar que não aceitariam pressão popular e manteriam o aumento das tarifas. O que aconteceu, então? Saímos às ruas. Encaramos a intransigência dos governantes, a repressão policial, a manipulação da grande mídia, a intolerância do conservadorismo e a infiltração de vândalos e extremistas (a serviço de quem?). Mostramos nossa força. E desta vez, não só pelas redes sociais. Levamos nossa voz, nosso inconformismo, nosso basta para as ruas. Mostramos que o espaço público é nosso e sim, vamos parar o trânsito sempre que for preciso.

 A luta acabou? Não, está apenas começando. Precisamos continuar atentos. Preocupados com suas imagens por terem “cedido à pressão”, governador e prefeito afirmaram ontem que os custos da redução da tarifa terão que sair de outros setores, sem especificar quais porque “as empresas responsáveis pelo transporte público não têm como arcar com estas contas”. Tentam seu último golpe de desmoralização do movimento. Querem nos fazer crer que por R$ 0,20 a menos nas passagens, seremos responsáveis por corte de verbas na educação, na saúde, na habitação... 

Vamos às contas. De acordo com informações do site do metrô, o serviço registra em média três milhões de passageiros em dias úteis. Multiplique este número por R$ 3,00. A SPTrans informa que os ônibus transportam seis milhões de passageiros por dia útil. Novamente, multiplique por R$ 3,00. Não vamos considerar os fins de semana. Também não levaremos em conta o que metrô, trens e ônibus arrecadam em anúncios publicitários e aluguel de espaços para comércio em seus terminais e estações. São milhares de reais arrecadados diariamente. Ora, se os custos com funcionários, manutenção e ampliação dos serviços é maior do que esta arrecadação, então, realmente há algo de muito errado nisto tudo. Senhores governantes está mais do que na hora de as planilhas dos transportes públicos serem abertas para que nós, a população usuária, possamos ver onde está o erro. Porque a sensação de quem anda diariamente em metrôs, trens e ônibus abarrotados, em condições cada vez mais precárias – especialmente nas periferias – é bem diferente da de vocês. Não é de hoje que desconfiamos e temos cada vez mais certeza de que o transporte que deveria ser público está sendo controlado por empresas privadas que se transformaram em verdadeiras máfias. Não nos esqueçamos que políticos que tentaram abrir esta caixa-preta sofreram represálias e em alguns casos pagaram com a própria vida por tentarem entender  que estava acontecendo com estes números. Fica aqui um apelo: Ministério Público cumpra seu papel. Exija as planilhas, investigue onde está sendo investido esta dinheirama paga por nós.

Se os nossos governantes ainda não entenderam o recado, explicamos de novo: Se usarem os R$ 0,20 como desculpas para cortar de outras áreas simplesmente porque é mais cômodo do que mexer com os lucros dos empresários, nos mobilizaremos e tomaremos as ruas novamente.

Conseguimos os vinte centavos, e agora, paramos por aí? Claro que não. A mobilização que se iniciou em São Paulo pela redução das tarifas e se espalhou pelo interior e Brasil afora, reacendeu a discussão política que voltou ao lugar onde deve estar: na esfera pública. Nos mostrou que mais do que aprendermos a votar, devemos aprender a cobrar quem elegemos. Mostramos aos nossos governantes que eles não podem administrar sozinhos, descolados da população e seus anseios. Políticos precisam perceber que não governam para legendas. Faz-se urgente que governo federal, estadual e municipal deixem suas siglas de lado para legislarem o que de fato interessa à população. Temos nós, sociedade, e políticos de todos os partidos que repensarmos seriamente o nosso sistema político. Não podemos mais ser reféns da tal da “governabilidade”, este monstro responsável por alianças partidárias para lá de esquisitas, pela troca de favores de legendas que permitem que partidos extremistas se apoderem de comissões, ministérios e secretarias e pela facilitação da construção dos “mensalões”.

O mundo acompanhou nossos protestos. Mostramos que podemos ser uma potência econômica, mas que o nosso principal problema – a má distribuição de renda – continua flagelando grande parte da população (aquela mesma que paga R$ 3,00 de passagem com um salário mínimo de R$ 678,00). A comunidade internacional ficou perplexa. Pensavam-nos como um povo apático, subordinado aos mandos e desmandos de nossos governos, uma população facilmente controlada pela política do pão e do circo. Mas, mostramos que não vivemos só de samba e futebol. Gostamos de copa do mundo, mas não a custos vultosos com estádios que custam muito mais do que deveriam, enquanto nossos hospitais e escolas sofrem descasos centenários dos sucessivos governos e partidos que se alternam no poder.

Ao longo dos diversos protestos mais gente ia se juntando ao movimento repetindo o bordão “não é apenas por vinte centavos” e agregando diversas outras bandeiras. E devemos daqui para frente pensar em como vamos lutar por muitas delas. Há muito ainda por fazer: retirada da PEC 37, reforma agrária, reforma política, investimentos em saúde e educação, salários justos aos trabalhadores, políticas públicas, contra a homofobia, contra corrupção (não de forma subjetiva, mas em questões pontuais), entre tantas outras coisas.

Apenas começamos. Os jovens do Movimento Passe Livre nos ensinaram que podemos voltar a sonhar. Que não nos esqueçamos da força que temos. #vem pra rua você também!


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