A surdez revitimizante do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
É de lamentar a insistência de alguns membros do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em continuar com as malfadadas experiências com crianças vítimas de abuso, submetendo-as à denominada “escuta não revitimizante”— já apontada por muitos especialistas da Psiquiatria, Psicologia e outras áreas de conhecimento, como danosas à criança.
Não bastasse a contraditoriedade às Resoluções dos Conselhos Profissionais de Psicologia e de Serviço Social — agindo em total desrespeito ao que estudam e pesquisam tais órgãos protetores das profissões e das prerrogativas profissionais de seus quadros--, o Tribunal de Justiça de São Paulo deixa de esmerar-se na busca de outras formas de esclarecimento de possíveis crimes contra crianças e adolescentes, buscando o caminho mais curto e mais gravoso para a própria criança, “quebrando-lhe novamente o braço para que diga se dói e se foi assim mesmo que ocorreu”, como diria a competente psiquiatra Maria Helena Mariante Ferreira.
Os eminentes desembargadores, juízes e promotores envolvidos no recém criado Grupo de Trabalho sobre Depoimento Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (que pretende expandir para 24 comarcas o nefasto projeto) fazem ouvidos moucos para todas as argumentações científicas e técnicas que têm mostrado à sobeja que qualquer “escuta”, “depoimento” ou congênere que submeta a criança ao rememorar de suas dores não traz nada além de fragmentos esparsos de uma memória muitas vezes traumatizada e que, por si só inviabiliza qualquer reprodução fidedigna e coerente de fatos havidos.
O dano completa-se com a transformação dos equipamentos da Política de Assistência Social, tão duramente conquistados, como os CRAS e os CREAS em centros de coleta de provas, através de memorandos ou formulários a serem preenchidos pelos técnicos da rede, em claro desrespeito às disposições do fazer profissional em tais espaços sócio ocupacionais.
Já que alguns dentro do Tribunal não querem escutar os técnicos e os cientistas, que pelo menos escutem o grito das crianças: “ao invés de reabrir minhas feridas, faça com que cuidem delas...”